É fácil para sistemas judiciais com mais
de 250 anos criticar uma jovem democracia. Mas pedir que um sistema
judicial infalível seja criado da noite para o dia é irrealista e revela
uma postura paternalista.
O Parlamento de Timor-Leste deliberou,
recentemente, a revogação dos contratos dos profissionais internacionais
que operavam no sector da Justiça. Esta deliberação deve ser vista como
um enorme passo em frente dado por Timor-Leste no sentido da sua
verdadeira auto-determinação e não como uma afronta à comunidade
internacional.
Timor revelou ao Mundo que está empenhado em
conquistar a sua independência também no domínio do poder judicial, ao
fazer cessar o papel que os magistrados internacionais desempenhavam
enquanto principais decisores e ao retirar o poder, não escrutinado, que
estes detinham sobre o sistema judicial.
Na qualidade de um dos
primeiros prosecutores junto de um tribunal penal internacional e de
Embaixador nas Administrações de Bill Clinton e de George Bush, tive a
responsabilidade de liderar esforços junto da comunidade internacional
para o desenvolvimento de Estados de Direito. Prestei e coordenei
assistência técnico-jurídica em países em desenvolvimento e em situação
de pós-conflito, tais como o Ruanda, o Camboja, a Serra Leoa e os
Balcãs. Tal como previsto no meu mandato, recrutei para esses países
advogados e magistrados para prestarem assistência no desenvolvimento de
competências e na promoção da responsabilização. No início de 2000, sob
a direcção e à luz das directrizes políticas da Administração do
Presidente Bill Clinton, fui enviado para Timor para desenvolver
esforços no sentido da criação do primeiro sistema judicial de um Timor
independente. O nosso objectivo declarado era recrutar peritos
internacionais para formar, aconselhar e prestar assistência no âmbito
do novo sistema judicial - mas nunca para o liderar. Aliás, a
comunidade internacional rejeitou a criação de um tribunal
internacional, pois acreditava que a administração interna do sistema
judicial era fundamental.
Embora sensíveis à necessidade de
assistência internacional, os responsáveis timorenses nunca deixaram de
almejar a total soberania do sector judicial. Contudo, com o passar do
tempo, os juristas internacionais passaram a deter o controlo sobre o
sistema judicial timorense, surgindo, assim, em Timor uma cultura de
total dependência judicial. Esta dependência tolheu o desenvolvimento
das capacidades judiciais internas de Timor e levou a que muitos
juristas timorenses relegassem as suas decisões para os mais experientes
juristas internacionais. Acresce que alguns dos juristas internacionais
revelaram flagrantes incapacidades, sendo que os seus actos não eram
sindicados por quanto o seu órgão de supervisão estava a milhares de
quilómetros de distância.
É fácil para sistemas judiciais com
mais de 250 anos criticar uma jovem democracia. Mas pedir que um sistema
judicial infalível seja criado da noite para o dia é irrealista e
revela uma postura paternalista. Os sistemas judiciais europeus e dos
Estados Unidos, apontados como exemplos, precisaram de séculos de
julgamentos, erros, controvérsia e reformas para ganharem a aceitação e a
confiança que depositamos neles, e, ainda assim, estão longe da
perfeição.
O Parlamento de Timor assumiu uma perspectiva de
longo prazo no sentido da independência, tomando medidas contra os erros
graves cometidos pelos juristas nacionais e internacionais e criando,
ainda, uma comissão independente constituída por peritos nacionais e
internacionais, que irá realizar uma auditoria ao sistema judicial.
Timor deu um enorme passo em frente no sentido de controlar o seu futuro e deve ser aplaudido por este progresso.
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